domingo, 13 de dezembro de 2015

DEVIA MORRER-SE DE OUTRA MANEIRA

Terça-feira, 7 de abril de 2015
DEVIA MORRER-SE DE OUTRA MANEIRA
Devia morer-se de outtra maneira.
transformamo-nos em fumo, por exemplo.
Ou em nuvens.

Quando nos sentíssemos cansados, fartos do mesmo sol a fingir de novo todas as manhã, convocaríamos os amigos mais intimos com um cartão de convite para o ritual do Grande Desfazer: " Fulano de tal comunica ao mundo que vai transformar-se em nuvem hoje, às 9 horas. Traje de passeio."

E, então, solenemente, com passos de reter tempo, fatos escuros, olhos de lua de cerimónia, víriamos todos assitir à despedida. Apertos de mãos quentes. ternura de calafrio. "Adeus!  Adeus!" E pouco a pouco, devagarinho, sem sofrimento, numa lassidão de arrancar raízes... ( primeiro, os olhos ... em seguida, os lábios ... depois o cabelo...) a carne, em vez de apodrecer, começaria a transfigurar-se em fumo... tão leve... tão súbtil .... tão pólen ... como aquela nuvem além (vêem?) - nesta tarde de Outono ainda tocada por um vento de láios azuis ...

José Gomes Ferreira

in blog de Rita Baleiro : http://como1livroaberto.blogspot.pt/2015/04/devia-morrer-se-de-outra-maneira.html

TEXTO DE CÉLIA PIRES

Há encantos e desencantos. Várias faces no mesmo ser. Há dúvidas e certezas. Mentiras e verdades. Há dias e noites. Sombras e luzes. Há prantos e risos. Momentos de ódio. Actos de amor. Há chuvas ácidas e granizos. Ventanias. Raios de sol sublimados. Há mãos douradas. Abraços infinitos. Há luares abençoados. Mares indefinidos. Há amizades perpétuas. Estios efémeros. Enganos indescritíveis. Há instantes perdidos. Águas furtadas. Túneis amarelecidos. Há dores imensas. Veleidades. Segredos adormecidos. Há ignorâncias exaltadas. Talentos recolhidos. Há arco-íris. Palco. Máscaras. Injustiça desmedida. Há poesia revelada. Retrato falado. Cântico sentido. Há vida. Morte. Há princípio. Fim.  

Célia Pires  14 de Dezembro 2015

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