terça-feira, 25 de novembro de 2014

MUDANÇA

Hoje, dia 25 de Novembro, pelas 15.30h, eu e a Joana Emília dinamizámos a 1ª Tertúlia " Uma Conversa por mês..."  da Universidade Sénior de Sousel, no auditório da Biblioteca Municipal de Sousel.
Tivemos uma assistência bastante interessada na apresentação das nossas propostas de trabalho e dos objectivos que nos propomos levar a cabo.
Uma Conversa por mês... terá lugar uma vez por mês, onde será convidada uma pessoa que domine o tema a trabalhar.
Li este texto Mudança de Clarice Lispector, adaptado por mim e a Joana Emília leu o poema de Pablo Neruda, Morre lentamente.
Foram sorteados 4 livros entre as pessoas presentes, um livro da Agatha Cristi, outro de contos, uma Bíblia Sagrada encadernada, e um livro sobre a Linguagem das Flores.


Sente-se noutra cadeira, do outro lado da mesa. Mais tarde, mude de mesa.
Quando sair, procure andar pelo outro lado da rua. Depois, mude de caminho, ande por outras ruas, calmamente, observando com atenção os lugares por onde você passa.
Mude por uns tempos a maneira de vestir. Dê os seus sapatos velhos. Em casa, nalguns dias, procure andar descalço. Tire uma tarde inteira para passear livremente na praia, no campo ou no parque a ouvir o canto dos passarinhos.
Cumprimente os amigos e conhecidos a sorrir. Sorria!!
Veja o mundo de outras perspectivas. Mude!!
Abra e feche as gavetas e as portas com a mão esquerda. Durma do outro lado da cama... Depois, procure dormir  noutras camas. Assista a outros programas de televisão, compre outros jornais... leia outros livros. Viva outros romances.
Não faça do hábito um estilo de vida. Ame a novidade.
Durma até mais tarde. Durma até mais cedo. Ouça música na cama. Relaxe. Aprenda uma palavra nova por dia numa língua estrangeira.
Corrija a postura, tente andar de costas direitas! Faça ginástica. Vá à natação. Brinque! Ria!
Coma um pouco menos, escolha comidas diferentes, novos tempêros, novas cores, novas delícias.
Procure a novidade todos os dias. O novo lado, o novo método, o novo sabor, o novo jeito, o novo prazer, o novo amor. A nova vida. Tente a mudança.
Procure novos amigos. Tente novos amores. Faça novas amizades.
Ame muito, cada vez mais, de modos diferentes.  Mude!!!
Almoce noutros locais, vá a outros restaurantes, beba outro tipo de bebida, compre pão noutra padaria. Almoce mais cedo, jante mais tarde ou vice-versa.
Escolha outro supermercado... outra marca de iogurtes... outra marca de sabonete, outro dentífrico... Tome banho em novo horário. Use canetas de outras cores.
Troque de mala, de carteira, de boné, compre novos óculos, troque de carro.
Deite fora os velhos relógios, guarde os despertadores chatos, não seja escravo das horas!!
Abra conta noutro banco. Aprenda novas actividades, vá para a pintura, para coisas novas, vá a outro cabeleireiro, ao teatro, visite novos museus, visite novas cidades. Vá passear para outros lugares. Vá passear com o seu neto. Mude!!
Leia um livro novo, escreva outras poesias.
Lembre-se de que a Vida é uma só!!! E pense seriamente em procurar um outro emprego, um trabalho mais ligeiro, que lhe dê mais prazer, que seja mais digno, mais humano, se está reformado procure uma nova ocupação,
Se você não encontrar razões para ser livre, invente-as. Seja criativo. Mas mude!!!
E aproveite para fazer uma viagem longa, se possível sem destino certo. Vá visitar um amigo que não vê há muitos anos. Vá visitar aquele lugar que sempre desejou conhecer.
Experimente coisas novas.  Troque novamente. Mude, de novo.
Experimente outra vez.
Você certamente conhecerá coisas melhores e coisas piores do que aquelas que já  conhecia, mas não é isso que importa.
O mais importante é a mudança, o movimento, o dinamismo, a energia. Só o que está morto não muda !
Experimente a mudança pela pura alegria de viver: não tenha medo do risco, sem o qual a vida não vale a pena!

Texto de Clarice Lispector  (adaptado pela Profª Zuzu Baleiro)

MORRE LENTAMENTE
Morre lentamente quem não viaja,
Quem não lê, quem não ouve música,
Quem destrói o seu amor próprio,
Quem não se deixa ajudar.

Morre lentamente quem se transforma em escravo do hábito.
Repetindo todos os dias o mesmo trajecto,
Quem não muda as marcas no supermercado,
Não arrisca vestir uma cor nova,
Não conversa com quem não conhece.

Morre lentamente quem evita uma paixão,
Quem prefere o "preto no branco" e os "pontos nos iis"
A um turbilhão de emoções indomáveis,
Justamente as resgatam brilho nos olhos,
Sorrisos e soluços, coração aos tropeços, sentimentos.

Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho,
Quem não arrisca o certo pelo incerto atrás de um sonho.
Quem não permite, uma vez na vida, fugir dos conselhos sensatos.
Morre lentamente quem passa os dias, queixando-se da má sorte,
Ou da chuva incessante, desistindo de um projecto antes de iniciá-lo, 
Não perguntando sobre um assunto que desconhece.
E não respondendo quando lhe indagam o que sabe.

Evitemos a morte em doses suaves, recordando sempre que estar vivo,
Exige um esforço muito maior do que o simples acto de respirar.
Estejamos vivos, então!

Pablo Neruda ( in Folha da Ala Sul)

far far away: O prémio Leya

far far away: O prémio Leya: Eu sou nova nestas lides, e por essa razão às vezes sinto-me um pouco inibida em expressar a minha opinião. A sensação que tenho é a de quem...

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RAÚL

Deitado debaixo da macieira, naquele fim de tarde, calmo e quente, Raul olhava calmamente as poucas maçãs que ainda estavam na árvore. Não tinha sido fácil deitar-se . Corpulento, nos seus 145 kg, cada vez sentia mais dificuldade em deitar-se. Mas ele gostava tanto de se deitar na erva fresca por baixo da macieira!
Sempre fora gordinho. Quando foi para o jardim de infância, a mãe foi à loja comprar o bibe de quadradinhos azuis e brancos, e constatou que não havia para o tamanho do Raul. O que fazer? o empregado da loja da Rua dos Fanqueiros, sugeriu-lhe que comprasse dois metros de tecido igual ao exigido pelo colégio e fosse a uma costureira fazê-lo por medida.
Quando a mãe chegou a casa e lhe disse que tinha que ir à modista mandar fazer o bibe, não achou nada de estranho. Ele até gostava de ir à D. Conceição que lhe fazia os calções! 
Quando chegava a casa da D. Conceição, esta elogiava-o sempre, ele gostava disso. "- Oh Raul, estás tão bonito, a tua pele é tão rosadinha, as tuas bochechas tão coradinhas, o teu narizinho tão pequenino no meio dessas bochechas rechonchudas, os teus olhinhos brilham enterrados nestas bochechas, o teu cabelo louro cheio de caracóis dão-te um ar tão meiguinho, tão celestial, de menino tão bem comportado!!! a mãe  ficava toda babada ao ouvir estes elogios da D. Conceição e ele também gostava de ouvi-los!!!.
Ela pegava na fita métrica e começava a tirar-lhe as medidas: primeiro a cintura, depois a anca, depois a coxa e finalmente junto ao joelho onde iriam terminar as pernas dos calções.  A cada medida ela ia dizendo: " Cresceste mais um pouquinho!! a cintura tem mais 5 centímetros!!" e sorria, com um sorriso feliz estampado no rosto magro e cansado.
Raúl, no recreio da escola primária procurava correr com os colegas, mas o rabo era-lhe tão pesado!!! ao fim de uma voltinha no pátio do recreio já ele estava sentado no muro baixo que ladeava o canteiro da grande acácia, de flores amarelas. Sentado à sombra da velha árvore é que ele se sentia bem... se os outros se queriam cansar e ir todos transpirados para a aula era lá com eles... ele preferia assistir calmamente às correrias e às maluqueiras dos colegas... e assim continuou a engordar, a engordar...
Nunca sonhou com desportos radicais, nada que o fizesse cansar e ficar exausto.... gostava de coisas calminhas... jogos de computador, ler banda desenhada, deitar-se no sofá e ver televisão.... ir à cozinha buscar uma lata de coca-cola mais um pacote de bolachas Oreo e estrafado no sofá ver um filme de aventuras, de acção , de guerras, de perseguições, de polícias e ladrões a correrem atrás uns dos outros... só de ver tanta acção ficava cansado!!!!
Cresceu, cresceu em idade, em tamanho e em peso!!! era um homem de 47 anos, bonacheirão, simpático, introvertido, de sorriso fácil, que estava sempre pronto a ajudar os colegas na repartição do Ministério da Justiça. Estava solteiro e não pensava em casar! Aturar uma mulher era uma chatice.... gostava de viver sozinho, na casa onde sempre vivera, no Alto da Ajuda. 
No dia em que lhe saiu o prémio do euromilhões Raúl nem queria acreditar! Não sabia se devia rir, se chorar, se pular...  sentou-se e respirou fundo!!! Não era uma quantia exorbitante, mas sempre  era alguma coisa que se visse!!Ia dar para comprar uma quintinha para os lados da Lourinhã... sempre gostou tanto daqueles sítios...
Acordou estremunhado!!! sentiu uma coisa a esborrachar-se na cabeça calva... era uma maçã meio madura meio podre vinda das últimas pernadas .....

Conto 
Zuzu Baleiro   Novembro 2014