terça-feira, 6 de abril de 2010

São as Nossas Paixões que nos Irritam


Contra as dos Outros

São as nossas paixões que nos irritam contra as dos outros; é o nosso próprio interesse que nos leva a odiar os maus; se estes não nos fizessem nenhum mal, sentiríamos por eles mais piedade que ódio.

O mal, que os maus nos fazem, leva-nos a esquecer o mal que se fazem a si mesmos.
Perdoar-lhes-iamos com mais facilidade os seus vícios se pudéssemos saber quanto os seus próprios corações os castigam.


Sentimos a ofensa e não vemos o castigo; as vantagens são aparentes, o sofrimento é interior.
Aquele que crê gozar do fruto dos seus vícios não se sente menos atormentado do que se o não tivesse conseguido; o objecto muda mas a inquietação é a mesma; por mais que evidenciem a sua fortuna e escondam o seu coração, o seu comportamento demonstra-o, mesmo sem que o queiram: Mas, para nos apercebermos disso, é preciso que não tenhamos um coração semelhante.


As paixões que nos dividem seduzem-nos; as que chocam os nossos interesses revoltam-nos, e, por uma inconsequência que nos vem delas, criticamos nos outros o que desejaríamos imitar. A aversão e a ilusão são inevitáveis, quando somos obrigados a suportar, por parte de outrem, o mal que faríamos se estivéssemos no lugar dessa pessoa.


Então, que seria preciso para bem observar os homens?
Um grande interesse em conhecê-los, uma grande imparcialidade ao julgá-los, um coração bastante sensível para conceber todas as paixões humanas e suficientemente calmo para não as experimentar.

(Jean-Jacques Rousseau, in 'Emílio')

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