As janelas da casa da
minha infância nunca me despertaram grande interesse. Há uma janela no quarto
de meus pais e outra na sala de jantar São pequenas, estreitas e ficam muito altas em relação ao chão, e por isso, mandaram
fazer uns estrados em madeira de 25 centímetros de altura por 30 de largura, colocados
nos vãos das janelas, para que mais facilmente se chegasse à janela e se
pudesse olhar cá para fora. As janelas não são airosas nem alegres, e por isso,
a luz que por elas entra não é muito forte, o que dá às duas divisões um ar
triste e pouco iluminado.
Quando queremos ver
algo que se passa na rua, temos que subir para o estrado, e de cima deste, podemos
então, olhar a rua. Isso, sempre fez que eu nunca gostasse daquelas janelas. De
dentro para fora, quando estamos sentados à camilha não vemos nada do que se
passa lá fora. Se ouvimos algum barulho diferente, então, lá temos que subir
para o estrado, abrir a janela e espreitar lá para fora. De fora para dentro,
vive-se a mesma situação, como são muito altas, ninguém pode vir e espreitar à
janela, não se vê nada cá para dentro.
Quando eu era muito
pequena, gostava de brincar com as minhas bonecas no estrado da janela da casa
de jantar, sentava-me ali e passava algum tempo entretida a brincar, mas não
muito tempo, porque aquele lugar não tinha sol e eu sentia-o um espaço escuro e
fechado...
Aos Domingos, as amigas
ou as primas da minha mãe vinham lanchar com ela, então depois do lanche, nas
tardes sem chuva, punham-se à janela, onde só cabem duas pessoas, e por isso
quando era mais gente, tinham que fazer à vez. Lembro-me de vê-las com os seus
melhores vestidos, muito bem penteadas e algumas delas, até se atreviam a pôr
um pouco de “rouge” ou de pó-de-arroz, mas nunca pintavam os lábios, pois isso
não era de “bom tom” numa senhora casada.
Quando eu tinha os meus
cinco ou seis anos de idade, veio para Casa Branca um casal, o Sr. Escobar que
era empregado de escritório do Sr. Martinho Rovisco e a D. Rosinha, uma jovem
mulher muito bonita, muito elegante, que vestia muito bem e se arranjava como
uma senhora da cidade. Penteava-se com uma linda trança que era o enlevo de
toda a gente, tinha uma cara muito bonita que as pinturas ajudavam a realçar. Faziam
um casal muito bonito, muito elegante, eram jovens e muito bem dispostos.
Tinham um filho, o Sérgio, que era da minha idade. Os meus pais fizeram amizade
com eles. Todas as tardes de Domingo, os três vinham para nossa casa, onde
lanchavam e jantavam. A minha mãe gostava imenso da companhia da D. Rosinha que
era mais evoluída que a maioria das amigas de minha mãe, e por isso lhe dava
muitos conselhos sobre as modas daquela estação, cremes para o rosto, e até
sugestões para se começarem a pintar... de culinária e sobre a decoração da
casa... lembro-me que nessa época a minha mãe começou a dar mais atenção à
maneira como se arranjava e começou a usar creme de beleza na cara.
Há um episódio muito
engraçado, que ainda hoje é falado aqui em casa. Quando se ia a Lisboa, a
viagem era de quatro a cinco horas, na furgoneta de meu pai. Então tínhamos que
nos levantar por volta das quatro ou cinco horas da manhã, para se chegar a
Lisboa pela manhã. Eu nesse dia não ia, estava a dormir no meu quarto. A minha
mãe andava a preparar-se e a arranjar-se para saírem o mais cedo possível. A
minha mãe chegou ao meu quarto, com as pressas do costume e pergunta-me: - “Oh
filha, onde é que está o creme para a cara?” e eu muito ensonada, disse-lhe: “
Oh mãe, está ali!” e apontei para uma das gavetas do psiché que havia no meu
quarto. A minha mãe abre a gaveta e vê outro creme e não o que ela procurava,
então muito rapidamente diz: “Oh filha não é este, é Benamor!!!!” . Sempre que estamos a falar de cremes de
beleza, vem esta “história” à baila “ Oh filha é Benamor!!!” é uma risota, pois vem-nos à
memória os dias felizes que vivíamos naquela época, onde os meus pais eram um
jovem casal, divertido, muito trabalhadores mas ao mesmo tempo muito divertidos,
e eu e o meu irmão éramos duas crianças saudáveis, bem dispostas e muito, muito
felizes.
Sem comentários:
Enviar um comentário